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TERRA NOVA 40 ANOS, HISTÓRIAS DO MASSAPÊ

Nesse mês de outubro, no dia vinte, são comemorados quarenta e dois anos de emancipação do município de Terra Nova.
No dia 20 de outubro de 1961, os distritos de Amélia Rodrigues (Lapa), Teodoro Sampaio (Bomjardim), Terra Nova, Conceição de Jacuípe (Berimbau), se desfiliaram de Santo Amaro tirando deste os limites que tinha com os municípios de Alagoinhas e vizinhos, Feira de Santana , Pedrão e Coração de Maria.

Era esperado que, a partir da emancipação, o novo município tivesse ascensão, tanto no campo econômico como no político-social. A expectativa era fundamentada na existência de uma usina, uma ferrovia, que favoreciam o crescimento do comércio; um hospital particular; dois consultórios dentários; consultório médico, cinema, futebol, várias escolas primárias, um ginásio, e uma gente alegre, em síntese, havia uma infra-estrutura para impulsionar a sociedade.
Nessas atividades é que se concentravam as pessoas da classe média, alguns remanescentes de senhores de engenho, lavradores de cana, professores, padres. Essa classe se caracterizava principalmente pelo poder econômico e pela tradição familiar. Era esse grupo quem liderava ou fazia acontecer a política, o trabalho e o lazer.

Em 1961, ano da emancipação, a ferrovia tinha 80 anos de atividade e a usina tinha apenas 60 de moagem. Sendo tanto um como outro empreendimentos muito importantes, ou até indispensáveis na economia. Seus desaparecimentos foram precoces, e muito prejudiciais para a região.

A indústria de açúcar que, desde o seu início, na época dos engenhos, viveu sucessivas crises, com o novo processo industrial da cana de açúcar, não mudou muito, as crises continuaram, culminando com o fechamento de uma a uma das usinas (S.Carlos, S. Bento, Passagem, Santa Elisa, Cinco Rios etc). A vez de Terra Nova chegou: no ano 1972, se tornou uma usina de fogo morto.

Já a ferrovia foi erradicada, em 1964, pelo governo da Revolução, mas seus trilhos ficaram à disposição das usinas que ainda estavam funcionando, e por algum tempo a linha foi utilizada pelas fábricas de Terra Nova e Paranaguá.

O desemprego direto e indireto, conseqüente do fechamento dos dois mercados de trabalho, foi amenizado pela Cimento Aratu, Petrobrás e posteriormente pelo Pólo Petroquímico, que absorveram uma mão de obra bem qualificada. Esse mercado fora do município tornou sua sede uma cidade dormitório. Como quem retorna da labuta necessita de descanso e lazer, faltou tempo para o pensar.
Outro fenômeno marcante deu-se na atividade comercial: boa parte dos proprietários de lojas e armazéns mudaram-se para Salvador, buscando novos trabalhos e escolas para seus filhos. Com isso, a migração dos jovens à procura de ascensão escolar e trabalho se tornou irreversível com a saída da família.
O município ficou sem uma classe média, pelo menos uma classe média nos moldes da anterior, e com ela desapareceu a micareta, palco dos cordões Riso-Entre-Flores, Viver-Só-Assim, Amantes-da-Farra, O Motorista; fechou o Cine Brasil, não ficando nem uma parede para foto; nem o futebol ficou, findou seu ciclo com o Vasco.
O mercado de trabalho já não comportava os profissionais em odontologia e medicina, que migraram para outros lugares; o hospital fechou com a usina. As pessoas que faziam tudo isso acontecer não tiveram sucessores.
Era uma nova etapa na escalada da sociedade local, uma etapa natural na História da Civilização, onde os personagens assumiriam novos papéis. Entretanto a geração que deveria receber a missão, em que o fator cultural passa a ter influência, se afasta da cidade por falta de opção. Nesse estágio se fazia necessário o surgimento de grupos na comunidade, com outros modos de perceber, liderar, gerados nos grêmios colegiais ou esportivos; sindicatos; associações; grupos religiosos. A inexistência deles deixa um vácuo muito perigoso na sociedade, pois incentiva os manipuladores e pode dar lugar a dirigentes autoritários e de competência duvidosa, que se consideram inexpugnáveis, pois administram para uma comunidade que não cobra e não percebe seus direitos.
No município de Terra Nova, hoje, pode se dizer que não existe classe média organizada, é essencialmente composto por uma população de jovens negros e afrodescendentes, bonitos e capazes. Não cabe mais esperar, a etapa da individualidade já foi vencida, ultrapassada, estamos no tempo do grupo. Essa sociedade precisa despertar para essa nova realidade e pensar seu futuro, não é possível que fique à margem das decisões.
Felizmente já se percebe, hoje, a preocupação de muitos filhos da terra que, apesar de já estabelecidos em outras localidades, não se desligaram das suas origens e juntamente com residentes participam da sua vida política e social. Com certeza grande parte são daqueles que partiram e não puderam exercer os papéis que a natureza lhes reservara. Esse comportamento é comum em outros municípios.

A escola, a igreja, com certeza os únicos centros organizados, formadores de opinião, têm que funcionar como tais, não lhes cabe mais apenas ensinar as lições de português e religião, os tempos são outros. Tão importante quanto, é ensinar, principalmente aos jovens, a ser cidadãos, pensar coletivamente, enxergar o outro, ler, associar-se. É a partir daí que cada um vai tomando consciência dos seus deveres e direitos individuais e coletivos, formando assim elites pensantes, indispensáveis na Sociedade.

HISTÓRIAS DO MASSAPÊ

Ninguém sabe o que vai comer, meio dia,
A não ser a dona da casa, e sabe-se lá se…!
Não porque não se tenha
É por que não se sabe mesmo.

Antigamente (só para os íntimos do tempo)
Antigamente, em Terra Nova, por exemplo,
Quando não se tinha geladeira pra conservar comida.
Cozinhava-se a carne na forma de lombo.

Feijão tinha de ser do mesmo dia,
Ou no máximo de dois, conservava fervido na panela de barro.

Era tudo programado.
Qualquer membro da família sabia o que se ia comer
De segunda a domingo, ou melhor,
De segunda a sábado

Domingo poderia ser andu, mangalô, feijão de corda.
Até mesmo galinha, que era prato especial.
Era tido como pra mulher parida.
Era um deus nos acuda,
Se saía de porta em porta:
Tem galinha pra vender?

Segunda-feira, dia da feira,
Bife, fígado, ou miolo, com farofa d’água.
Pela noite, como o almoço foi fraco,
Comia-se cozido.

Terça-feira era dia de feijão.

Quarta feira, os muitos católicos,
Guardavam o dia, não se comia carne,
Era moqueca de bacalhau
Com mamão verde, feijão doce.

Quinta feira novamente feijão
Machucado com machucador
Feijão com carne do sertão, de boi e toucinho
Era feijão, não chamava feijoada não.

Sexta feira era dia-de-guarda.
Carne nem pensar, quase todos católicos.
Bacalhau ou surubim ou marinheira do Pojuca
Mamão verde cortadinho

Sábado, feijão, carne só pra dar gosto.
Complementava bife, ou fígado, miolo, rins.
Não era dia de feira, mas matavam boi.

Tudo era programado, até a hora.
Com todos sentados à mesa.
Almoço dividido rende menos.

Tudo isso com farinha

Domingo era o único dia,
Único que saía do programa.
Até mesmo a hora era diferente.

Escrito por Viraldo B. Ribeiro
Sáb, 16 de Maio de 2009 11:42
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Número 30 – Edição 01 – Terra Nova, Outubro 2003
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