• Sem categoria

LINHA E A VASSOURA e SÃO BENTO DE INHATÁ

LINHA E A VASSOURA

Linha e a Vassoura

Dona Marlene tanto varre quanto costura.
Varre mais do que costura.
Vassouradas seu ganha pão.
Agulha e linha, quase distração

Várias ruas muitos paralelepípedos
Haja linha muitos pontos.
E o Bangüê foi chegando, nos intervalos dos pontos
No descanso da vassoura
E deu no que está aí:

– Como é o seu nome?
– Me chamo Marlene Ramos, nasci aqui em Terra Nova em 1964.
Foi assim que começou a conversa com aquela mulher Gari, que toda manhã, sozinha ou com as duas filhas, um carrinho de mão, uma pá e sua vassoura, um torço na cabeça e sua surrada farda azul. Também era preciso saber por que não costurava mais.
– Já não costura mais dona Marlene?
– Faltou linha.
– Faltou linha! Como assim?
– Ah! Sim, custa dois e cinquenta. Agora só quando sair o dinheiro.
– Se for só por isso, dar-se um jeito.
E ela rio prendendo os lábios para não mostra os dentes que faltavam.
– Nasci do outro lado, no Hospital, ficava ali próximo da Prefeitura.
E a memória projetou a rua dos Correios. Lá morava dona Maróca do Correio. Eram cinco ou seis casas de avarandado, parede-meia, além do Posto Médico, que separava as casas do Hospital.
– Conheceu Arlinda Rancheira, ela morava mais ou menos a traz do hospital.
– Não, nunca ouvir falar.
– Pois é! quando ela gritava filho Neguinho lá do alto se ouvia no Jacu.
– Seu pai trabalhou na usina?
– Trabalhou sim, era tratorista. O nome dele é Claudemiro Cadu.
Ele está vivo, mora no Caípe (completou).
Onde você estudou, lembra-se de seus professores?
– Estudei em vários colégios, o último foi o Oscar Pereira. Dos professores me lembro do de matemática Vilza, e de geografia Vera.
– Isso no ginásio?
– Sim, balançando a cabeça. Estudei até a oitava série no primário e até a quinta série que hoje e o primeiro ano de ginásio. Professor primário não me lembro o nome dela, mora perto da casa de Jonas ( vice-prefeito).
– Parei o ginásio por causa do casamento.
– Aonde a senhora mora?
– Na rua Santo Antonio, lá em cima.(E continuou)
– Depois do que me tirou do ginásio tive: o pai da primeira filha, tem vinte anos e me deu um neto. Depois veio o pai dos quatro e que é o pai dessa que você vê aqui.
– Mora ainda com ele?
– É ruim em! Me deixou grávida de seis meses. É um filho homem de oito anos.
Mas ninguém fica só, dona Marlene!
– Agora é o rapaz do Besouro – Mossoró.
– E o trabalho, foi sempre aqui em Terra Nova?
– Nada. Trabalhei nas casas dos outros em Terra Nova,em Salvador. Os meninos ficavam com minha irmã. Em Salvador trabalhei em Pernambués, na Barra, baba e cozinha.
– Por que deixou?
– Porque minha irmã não podia tomar mais conta dos meninos.
– Quando foi isso?
– Quando minha menor tinha três anos. Antes de voltar para Terra Nova trabalhei em Simões Filho na feira. Vendia tempero verde, verdura que comprava na Ceasa. Levei só dois anos. Os meninos ficavam comigo lá eu sozinha.
Quando voltei trabalhei avulso com Jajá (Prefeitura). Depois de quatro anos fiz concurso e já tenho oito anos, sendo cinco de concurso.Agora já chega!
Depois do jachega deu trabalho para continuar a conversa. Ela já não descansava por perto, desviava o caminho. Somente a sua cachorra Thuthuca mantinha a rotina, ficar deitada embaixo do carrinho enquanto dona Marlene trabalhava. Mas finalmente:
– Dona Marlene, e o nome de sua mãe?
– Emilia Ramos França
– Ela ainda é viva?
– É,é viva, mora na mesma rua que meu pai mora, na rua do campo, lá no Caipe.
– Sua mãe acompanhava suas lições da escola?
– Acompanhava sim! Mas não precisava ela dizer: vá fazer o dever. Eu mesmo fazia sem que ela mandasse.
– E seu acompanhamento com seus filhos?
– Pergunto a eles se entenderam o dever, se não mando que perguntem á professora. Ainda ontem ensinei o dever de geografia e de história, pra fazer prova. Quando chegou em casa perguntei se foi difícil ou não.
– E sobre o acompanhamento na escola, reuniões, conversa com os professores?
– Mensalmente tem reuniões. Eu não vou muito porque não tenho tempo
– E os programas do Governo, tipo bolsa família…?
– Eu recebo Bolsa Escola de três filhos.
– Dona Marlene?
– Não agora já chega, tenho que ir se ficar aqui, de repente passa por lá um fiscal e eu não estou no local do trabalho.
Levantou-se do sofá, na sala do Espaço, dizendo até logo, até amanhã.
E ficou sem esclarecimento seu grau de parentesco com Chico França, um preto puro sangue, Administrador de Campo em Terra Nova e na região, e que teria uma relação de parentesco com os Pinto de França, família portuguesa proprietária do Engenho Aramaré, engenho muito importante para edição do livro Cartas Baianas. Um Pinto de França quando esteve em Terra Nova, foi ciceroniado por Artur Inácio, na época vereador, que nos falou do interesse do mesmo em conhecer e conversar com um França de Terra Nova.
– Até logo Dona Marlene França, até logo.

________________________________________

SÃO BENTO DO INHATÁ

 

SBENTOVi São Bento passar!
Passando, passando…misturando-se
Desaparecendo no mato, no canavial.
Sumindo dentro do nada.
Aluna da professora Maria da Fé.
Professora, também, no seu povoado.Dona Lió balançou a cabeça resignada:
(Terminava o quadro riscado a bico de lápis)
Vi São Bento passar!
– De que lado o sol aparecia de manhã?
Esta senha do Bangüê deu corpo ás lembranças.
– Ah! Lá dos lados de Terra Nova. (resposta sem pestanejar)
Estava determinado o lado leste do desenho
Lado oposto ficava a Capela (O São Bento lá de cima)
– Quando chovia, ir para Capela era quase impossível.
– Uma ladeira muito íngreme e escorregadia.
– Aliança ficava daquele lado. (indicava o sul no papel, ainda em branco)
Com esses pontos de referencia, São Bento do Inhatá
Veio vindo de sua memória: as casas, escola, armazém,
Chalé, balança, quem morava, onde trabalhava.
E tudo se arrumando como se ela estivesse
Sentada na frente da U.S.B.
A usina e seu povoado, formado pelos trabalhadores.
Aqui ficava a Usina, ali na frente o tanque.
O Chalé e sua capela ficavam a direita próximos da ladeira.
Perto estava a casa de Doutor Melo, no outro lado da estrada
O desenho foi se formando na forma de um retângulo.
Pelas costas, Terra Nova e, entre esta e a usina,
O canavial uma cerca a linha férrea
– Não tinha feira, nem lojas, nem vendas, não era permitido.
– Gêneros básicos eram adquiridos no Armazém da usina
– Os trabalhadores recebiam vales.
– Roupas, remédios e outros produtos compravam-se na Capela.
O Chalé, murada em curva, ficava um pouco recuado no pé da ladeira ,dava acesso lá para cima.

Escrito por Viraldo B. Ribeiro 

Sáb, 16 de Maio de 2009 13:08

________________________________________
Número 46 – Edição 01 – Terra Nova

Viraldo Ribeiro

Viraldo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *