RECUPERAÇÃO DOS ENGENHOS

Escrito por Viraldo B. Ribeiro 

Qui, 06 de Janeiro de 2011 19:31 almas

 

(Este Trabalho foi entregue em mãos ao Secretário do Ministério da Cultura. Consta registrado na nossa agenda de 2003, dia 08 de março: “Entregamos hoje o projeto Recuperação das Ruinas dos Engenhos do Recôncavo ao Minisstério de Cultura, na pessoa do seu Secretário Especial … houve um intusiasmo muitissimo além da nossa expectativa.)”.Apresentação

Diz-se que tudo já está por 

 

aí e que não existe nada novo no mundo, que é preciso só descobrir. Asenergias estão armazenadas nas cabeças de uns e de outros,tudo num processo, esperando a convergência dos momentos para ser.

Tudo leva a crer que estamos para dar um importante salto; sente-se no ar que a Natureza trama algo de muito bom.

Se soubermos aproveitar este momento, com certeza um futuro mais solidário advirá.

Há não muito tempo, dois anos talvez, temo-nos permitido prazerosamente percorrer o Recôncavo, subindo e descendo ladeiras, no meio de quixabas, dentro de canaviais, pastos de gado e rios, literalmente, metendo o pé no massapê, com a finalidade de fotografar ruínas de engenhos, capelas, matrizes, igrejas do Brasil Colônia.

Essas construções, que já foram muitíssimas, hoje são poucas a atestar aquele passado histórico. Restam hoje, em conjunto ou separado, casa-grande, sobrado e capela; casa- grande e engenho; só casa-grande; capela ou igreja; ou apenas marcas dessas edificações.

Numa pesquisa que fizemos no Arquivo Público, nos deparamos com um Caderno, (Guia de Secção Colonial e Provincial Livro 609 pag. 57/58) com conteúdo, na forma de relatório, elaborado por vigários no ano de 1757, tratando das Freguesias da Bahia, onde estão relacionados também os engenhos situados nas respectivas Freguesias. Já nessa época os vigários constatavam a existência de ruínas anônimas dessas oficinas de fazer açúcar.

Outras fontes, também, foram base de listagem de engenhos não citados nos relatórios dos vigários, presumindo-se terem sido edificados após aquele ano.

Esses e aqueles imóveis hoje são sedes de fazendas, alguns em bom estado, visitados, esporadicamente, por escolares ; servindo como cenário para documentários. Outros, na forma de casa-grande, capela e igrejas também dentro de fazendas ou mesmo de canaviais, em pé ou como ruínas sem qualquer perspectiva de preservação, tendem a desaparecer.

À medida que íamos-nos atolando no massapê, o amor por aquelas ruínas aumentava, era como se pedissem socorro. Aí começa o sonho de como passar tudo aquilo para o outro

Nosso sentimento é de que esta coisa tem um grande valor como um dos meios para ajudar o negro ”os não alforriados” reencontrar-se como cidadão, nesta região onde predominamos visivelmente; tem uma importância imensa para a educação escolar “fora da sala de aula”; é importante para o turismo, para o emprego de mão de obra, para integração dos municípios. Era um sonho viabilizar isso.

Sem muita pretensão, mas cada vez gostando mais, continuamos com o pé no massapê; é uma relação de amor.

Com um bom volume de fotos, começamos a pensar em expô-las em uma pequena sala em Terra Nova, para quem quisesse apreciá-las e saber a sua história. Se é uma relação de amor, é doação, é troca, nos incomoda não dividir, não exibir.

De repente Lula se elege Presidente do Brasil e agradavelmente nos surpreende na escolha do seu Ministro de Cultura, Gilberto Gil.

O pensamento voou, voltou a ser sonho, não cabia numa sala em Terra Nova.

Mas não era isso que esperávamos, que alguém se levantasse em favor da preservação do que resta das ruínas dos engenhos do Recôncavo?

E se a Natureza tivesse nos escolhido para entregar a mensagem a alguém que ela também preparou para recebê-la?

E se a Natureza juntou sua própria energia à nossa, nos fez de agulha que aos poucos foi costurando esses retalhos para servir ao Recôncavo de uma outra forma, ontem, como uma indústria primária, amanhã, como uma indústria de serviço?

Como saber que o momento é chegado? Poucos decifram estas mensagens, então o melhor que se faz é fazer, é obedecer ao impulso interior, ao pedido de socorro do interior.

Então, senhor ministro, como se diz no bom português, o fim destas é para dizer que estamos entregando, em retratos, um retrato dos Engenhos do Recôncavo, que carecem ser mantidos vivos para servir sua comunidade. 
Objetivo

O nosso sonho é não para se criar nada novo, novo no sentido de tornar essas edificações naquilo que um dia foram, e sim mantê-las vivas e sadias como estão. É dar a elas vigor.

Se forem paredes de igrejas, que sejam assim conservadas nesse estágio. Que cesse ali o grau de deterioração de uma senzala, de uma capela.

Basta construir junto uma casinha simples para abrigar objetos e registros, ou uma placa sintetizando sua história. Que fiquem próximos da comunidade os materiais, as relíquias e não sejam encaminhados, como única alternativa, para exposições e museus na Cidade Grande, mudando esta prática de privilegiar os grandes centros.

Quem sabe, alterando um pouco a forma do abrigo específico de telefone público, onde a empresa já mantém imóvel.

Se for uma parede, ou uma alvenaria, a mesma forma de tratamento para preservação.

É evidente que estamos num limiar de um novo tempo, quando também os jovens dos anos sessenta e setenta estão tendo a oportunidade real para dar um novo norte, também a outra área, a área política. Foi assim com as artes. Não tem como fugir, é a força da Natureza. Por isso esperamos que esses marcos que ainda restam no Recôncavo não sejam lembrados amanhã por outros vigários, como: aqui existiu a ruína de um engenho.

Com certeza nossos netos nos cobrarão, como hoje reclamamos, os documentos sobre a escravidão queimados para não deixar vestígio. “Uma grande parte dos documentos sobre a questão dos escravos e do tráfico foi destruída no Brasil em 1891, após a abolição … As razões deste `ato de fé ‘ abolicionista, atribuído à iniciativa de Ruy Barbosa, então Ministro da Fazenda” Verger, Fluxo e Refluxo pág 16.

Fontes de Apoio

O governo Lula trabalha com a hipótese de que os investimentos tenham efeito multiplicador na forma do social; de ocupação de mão de obra; de educação; fome zero.

Não é fazer só por fazer, muito menos para propiciar receita para empreiteiras.

Como a política desse novo governo preconiza que haja um entrelaçamento entre os ministérios, que os investimentos cheguem à comunidade procedentes da ação de vários ministérios integrados, (uma estrada nova, beneficia o transporte, a agricultura, a saúde).

Cremos que um investimento que atenda ao pleiteado congregue recursos já previstos no Orçamento dos Ministérios envolvidos no propósito.

É visível que um projeto deste está dentro da agenda não somente do Ministério da Cultura, mas também da Educação,

Turismo, e Ministério do Trabalho. Acreditamos que nessas áreas, nos seus respectivos Orçamentos, haja verbas carimbadas aplicáveis num projeto coordenado pelo Ministério da Cultura.

No âmbito do Estado, deve haver interesse tanto na área de educação como na de turismo.

Também devem ser envolvidos os Municípios, as entidades organizadas, os proprietários das áreas que os imóveis estão situados, ou que sejam seus donos.

Na fase de Conselho Nacional do Petróleo, a necessidade de expansão levou a Petrobrás a indenizar várias propriedades nos municípios do Recôncavo Baiano: Candeias, Madre Deus e São Francisco do Conde. Áreas particulares onde outrora estavam edificados Engenhos, com todas os seus estabelecimentos (capelas, casa-grande, senzalas) necessários para manter a sociedade açucareira, foram substituídas por outras edificações condizentes com a nova indústria.

É muito provável, portanto, que a estatal tenha preservado, nos seus arquivos, documentos e fotos das terras indenizadas, cujas edificações e canaviais foram destruídos no avanço da exploração do minério. Ainda encontramos de pé ruínas dentro da área da Petrobrás (Bueiro do engenho S. Paulo, em Candeias e da usina D. João, em S. Francisco do Conde).

Possivelmente outras existem em perímetros mais reservados ou menos acessíveis.

A Petrobrás, portanto, que já participa de vários projetos culturais, tem experiência para dar apoios logísticos, documentais e financeiros nessa proposta.

As empresas telefônicas indenizam ou alugam áreas para instalarem suas antenas repetidoras, colocadas necessariamente em pontos altos. Tanto igrejas como capelas, casa-grande e engenhos estão situados em locais elevados. Seria o caso de uma parceria entre essas entidades, proprietários e órgãos públicos.

Muitas soluções podem surgir da motivação da comunidade, e é fundamental que ela interaja, pois só assim, despertada culturalmente, perceberá outros valores, garantido a permanência e continuidade do serviço.

Nesse mundo de meu Deus, somos mais das vezes movidos pela vaidade. Ele, muito esperto, delega a alguns a capacidade de bem utilizar essa qualidade em prol da maioria.

A televisão, por exemplo, é um veículo que tem uma capacidade incrível de servir-se de certas qualidades do ser humano em favor dos que estão à margem do consumo. Basta uma campanha com estrelas, para que gestos de solidariedade apareçam em socorro do outro, que mais das vezes está distante, enquanto um seu vizinho com idêntica necessidade não é percebido.

Esta falta de percepção e de motivação se manifesta com mais freqüência quando se referem às coisas inanimadas.

Uma capela abandonada dentro do canavial, precisa às vezes apenas que juntem duas ou três pessoas, com cal, água e vassoura e, em dois dias, ela fará um contraste lindo com o verde da cana. Nosso crescimento interior não alcançou ainda esse estágio; é preciso que essa qualidade latente seja despertada por quem já tem aflorado esse sentimento e tem como colocá-lo em prática.

Conclusão

Outros tempos, ações diferentes, as intervenções não devem ser mais as mesmas , as iguais. Se são outros tempos, as consecuções também devem ser mais inteligíveis , mais racionais, obras construídas com abrangência coletiva.

Achamos oportuno que um órgão público ou privado, como a Universidade Federal, a Federação das Indústrias da Bahia ou outra Organização, incentive os proprietários desses Engenhos ou ruínas a criarem um grupo, tipo Associação, visando à recuperação ou estabilização das ruínas

Idéias é que não faltam. Como disse, no início, tudo está ai para ser descoberto. Cabe ao Senhor Ministro da Cultura abusar do convívio, da capacidade, do carisma do poeta e pensador Gilberto Gil e soluções simples, dentro dos limites orçamentários, aparecerão.

Com a mudança, as ruínas revigoradas, com a participação da comunidade, não somente a imagem será outra, mas também muitos se verão refletidos naquele espelho.