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DE FOGO MORTO; VIAJANDO NO TEMPO

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Número 17 Edição 01 – Sítio Inhatá, outubro 2002

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DE FOGO MORTO

BUEIRA economía, principalmente no seu setor de agricultura, é calcada em três fatores: Terra, Trabalho e Capital. A terra é o espaço físico; o trabalho é a mão de obra e o capital é o investimento, são os maquinários. A combinação desses fatores é responsável pelo custo de produção e conseqüentemente pelo preço final do produto. Com certeza, a falência da indústria da cana de açúcar, no Recôncavo, foi conseqüência de uma combinação inadequada ao longo do tempo. No inicio, no Brasil Colônia, no tempo dos engenhos, a terra foi doada; o trabalho e o capital eram semi-remunerados (a compra de escravos era um investimento e não um contrato de trabalho), as despesas posteriores eram como as de um equipamento, ou seja, só despesa de manutenção. Além de não provocar despesas com a remuneração da mão de obra, os escravos eram utilizados como se máquinas fossem. “No engenho Santana, os cativos levantavam-se por volta de cinco horas da manhã e faziam suas orações matinais antes de seguirem para o campo. Tinham um pequeno café mais ou menos três ou quatro horas depois almoçavam ali mesmo no campo, e continuavam trabalhando até o anoitecer… os escravos trabalhavam de seis da manhã às seis da noite. Chegada a safra, as demandas de trabalho aumentavam, e os cativos na fábrica do engenho precisavam almoçar a toda pressa enquanto o trabalho continuava.” Do livro Segredos Internos, de Stuart Schwartz, pág.128 “Eles trabalhavam desde a madrugada até a noite, ficavam expostos ao sol e à chuva, mal-vestidos e mal-abrigados, e eram pessimamente alimentados … os camponeses em Portugal tratavam melhor seus bois que seus senhores de engenho aos escravos, os quais, no Brasil ,não só eram obrigados a ‘trabalhar de dia, se não ainda de noite, rotos, nus e sem sustento’ “ idem pág 130 No decurso do tempo, os custos de produção foram aumentando, a disputa para manter o mercado externo era grande. Outros fatos também influíram negativamente (do ponto de vista do proprietário) para que tanto engenhos e usinas se tornassem de fogo morto: epidemias, recrutamento de escravo para guerras, ciclo do ouro, ciclo do café, fretes etc. A exploração da mão de obra escrava foi se tornando mais cara, quer seja pela conquista da liberdade dos negros, quer mesmo pelo preço cobrado para importar clandestinamente os negros da África (tráfico suspenso em 1830). Os recursos da remuneração da mão de obra (salários) retornam para o ciclo da economia na forma de consumo. Por isso a Inglaterra liderava e propunha a liberdade dos escravos; queria substituir mão de obra por equipamentos; inclusive colocava como condição essencial para reconhecer a independência de 1822. “Os portugueses, a não ser pela marinha, fazem todo comércio com os Ingleses . É assim com a comida, com as vestimentas, pagando seus vinhos e cobrando muito por serviços…A situação era, não obstante, paradoxal. Faltavam manufaturas, não se produziam alimentos ou roupas em quantidade suficiente para atender às necessidades mínimas da população, mas, mesmo assim, vivia-se de maneira ostentatória, por conta do ouro que não parava de afluir da América”. A Longa Viagem da Biblioteca dos Reis, Lilia Moritz Schwarcz , pág.39  

VIAJANDO NO TEMPO    

gmortoAs nossas vistas e os nossos ouvidos não distinguem, uma pessoa de outra somente pela sua capacidade de enxergar ou ouvir mais ou menos. Há, dentro de cada um, graus diferentes de emoção, que individualizam,que distinguem a agudez. O que se percebe pela audição ou pelos olhos nunca é a mesma coisa para a grande maioria das pessoas. Somos seres racionais, portanto com capacidade de, através de exercícios, aprender a aprimorar não só o desempenho emocional , mas também o físico.

Para muitos , uma igreja em ruínas, ou uma casa velha, é apenas um amontoado de tijolos carcomidos, coisa velha sem serventia.Para outros, mas nem tantos, a visão é outra: é uma viagem no tempo. Como o tempo não pára, a viagem só é possível transformando as coisas. E assim, com a vara mágica da imaginação, se dá vida a tudo aquilo. E assim, com cenário alterado, do jeito de ontem se visualiza hoje. Com estudo, exercícios, exemplos, a capacidade interior, podem se modificar. Às vezes, e com certeza muitas vezes, aquilo que parece ser um dom especial, está apenas adormecido no outro esperando ser despertado. É possível até que esteja constantemente se manifestando, e o outro não perceba.

Essa conversa é para traçar um paralelo entre Maracangalha e Terra Nova. O povo desses dois lugares guarda grandes semelhanças, e não poderia ser diferente: ambos viveram uma vida de cana, canavial, engenhos e usinas. E por isso, como os demais negros do Recôncavo, brincavam, se distraiam do mesmo modo: era o samba de roda, lindro-amor, quermeces, queima de palhinha, mês de Maria nas casas. Esses folguedos foram desaparecendo com o tempo. Partiram com o Trem de Catuiçara, com a moagem da usina, antes até da chegada do asfalto e da televisão. Maracangalha consegue preservar ou resgatar, a verdade de que, apesar de tudo, o samba continua no pé daquela gente. Em Terra Nova isso pode ser resgatado.

O primeiro passo seria recuperar a rua do Caípe, dar-lhe vida, auto-estima. Estão ainda, como há mais de cinqüenta anos as casas onde moraram: Seu Tomaz ( pai de Chumba), Seu Portela, ( pai de Zé Ligeiro e Tatu), Manuel da Tamoia. Também as casas de Aloísio Souza e Seu Camões, na parte de cima. A rua do Caípe é com certeza, o único pedaço de Terra Nova que se preservou intacto, possivelmente por ainda pertencer a Usina. É preciso preservá-la, torná-la seu Cartão postal.Vejo esse pedacinho limpinho como as ruas de Maracangalha. Seria fantástico que Terra Nova adotasse a rua do Caípe como o seu símbolo, e ali com datas fixadas, retornasse, agora como folclore, o que ontem era vida: queima de palhinha, samba de roda, futebol no campo da Mangueira.

MARACANGALHA

O Bangüê mostra duas fotos, recentes, das ruas do Caípe, em Terra Nova, e de Maracangalha, Cinco Rios.

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