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DEVER DE CASA; MOENDA; OS CATINGUEIROS

DEVER DE CASA

dever se casaA meninada de Terra Nova tem procurado, com muita freqüência, o Espaço Bangüê para efetuar as pesquisas solicitadas pelos seus professores.

A satisfação do Bangüê é muito grande, pois se sente participante do processo de educação. Mas há de se considerar, (caso a pesquisa não seja uma forma de treinamento da escola, para que os alunos busquem dados fora dela e de suas casas) a importância da existência da família entre a escola e a biblioteca. O pedido dos professores é um simples dever de casa. É uma forma de a família interagir nessa fase de grande importância para o ser. Pois bem, é nessa etapa que se apresenta um dos grandes vilões do aprendizado, que é a desinformação dos pais. É nesse momento que as famílias pobres, negras, com pouco conhecimento, não participam como parceiras dos filhos na resolução do dever de casa. Porém, sendo Terra Nova um município pequeno, havendo integração, consegue-se uma boa educação.
Os que podem pagar, as “bancas” resolvem o problema, para os que não podem pagar a Biblioteca seria a solução. Se na pesquisa os alunos estiverem orientados, souberem o que realmente vão fazer, tudo bem. Entretanto nem sempre é assim: chegam em grupos, cada um se responsabilizando em copiar uma parte da pesquisa, sem um mínimo de noção do que escreveu, preocupado somente com a nota. Se lhe pedirem para ler o que copiou, responde que não sabe.
A participação direta do Bangüê é inevitável, e quem sabe, esta também não seja sua responsabilidade: orientar como se estivesse ajudando num dever de casa. A postura não poderia ser diferente, se o seu desejo é ser útil no processo.
Recentemente, diversas equipes de alunos estavam no Espaço pesquisando sobre plantas medicinais. Procuravam por livros que contivessem o assunto, perguntavam se no Bangüê tinha Internet. Era uma pesquisa típica para se resolver em casa, com a família, com os vizinhos, com os parentes.
Sendo um trabalho sobre plantas medicinais, há de se perguntar: quem em casa não já feriu um dedo, teve um corte no pé, bateu a testa e gerou um galo, teve uma dor de barriga, de cabeça,gripe,dor de dente? Qual a ação imediata que têm os mais velho, principalmente nas camadas mais desprovidas de quase tudo? Não é recorrer a um chá de limão, alumã, mastruz pisado com leite, chá de bucha de coco, erva cidreira, capim santo, pó de café, nódoa de bananeira, jurubeba, sabugueiro, água de coco, pitanga, até mesmo vassourinha para rezar mau olhado ou cobreiro?
Com certeza, parando para pensar, encontrar-se-á de A Z, nomes de plantas que curam, que aliviam e sempre há em casa ou no vizinho alguém que sabe para que servem, como preparar o lambedor, o chá, o xarope, o ungüento.
Esse tipo de pesquisa deveria ser sempre repetida e com orientação para que grande parte fosse resolvida em casa. É também um exercício que a escola faria com os pais de seus alunos, objetivando uma maior aproximação.
Em qualquer circunstância, seja em que tempo for, as variáveis para a educação escolar serão sempre três: escola, família e aluno. Para se ter um bom resultado, é indispensável um bom entrosamento entre elas. É preciso que a criatividade seja o fator constante dessa equação.
(Escola + Família + Aluno) x Criatividade = Aprendizado. É preciso que todos enxerguem dessa forma.
Ap= (E + F + A) x C.

 

MOENDA


muendaSetembro está chegando. Há 30 ou 40 anos passados, nos últimos dias Mês de agosto, todas as usinas do Recôncavo já estavam em condições de iniciar a produção de açúcar. O período de reparos estava terminado ou por terminar. o repicar dos martelos nas chapas de ferro, produzindo aquele som, quase com o passado, já não tinha mais a mesma freguência, perderam o rítimo. A data já estava amrcada, as últimas chuvas de inverno comerçavam a rarear, deixando o massapê quase apto para a circulação dos carros de boi e dos burros de cana, o que melhorava também as condições para os cortadores de cana se movimentarem dentro dos canaviais entre as canas, os capins, os plantinhas nativas, “malícias”.

Durante o corte, aqueles homens iam deixando as torceiras cortadas, para que outros trabalhadores chegassem terras nos tocos. Eram essas socas que, em pouco tempo, transformavam o tabuleiro, novamente, em um vasto campo verde.

As máquinas que puxavam os vagões de cana, provavelmente a essa altura já davam suas idas aos Pontos de Cana, testando suas condições, após os reparos durante a entressafra.

O pessoal de Terra Nova, bem como o da usina Aliança, S. Bento, S. Carlos, Paranaguá estavam na expectativa da botada. Meninos e rapazes, mais dia menos dia, não precisariam mais chupar cana escondido dentro dos canaviais.

Todo ano era a mesma coisa, há mais de 100 anos desde a safra de 1902/1903 até o ano de 1972, nessa época vivia-se o rebuliço. Estava tudo pronto para o início da partida, seis meses sim, seis meses não; de setembro a abril (começo das chuvas).

Toda a população captava o impacto não somente das vésperas da moagem, na botada, mas também no decorrer da moagem. Nem precisava trabalhar na usina, e tanto fazia ser homem, mulher ou criança. A expectativa do aumento de circulação de dinheiro era suficiente para afetar a todos (comércio, barbearias, sapatarias, vendas).

As mães de famílias preparavam bandejas de cocadas para seus filhos vender aos operários, dentro da usina ou no portão de entrada. A meninada, depois da escola, danava-se a chupar cana que recebia dos carreiros ou dos condutores de burro, além das que tiravam diretamente dos vagões quando as máquinas de cana da Usina Paranaguá paravam na Estação da Terra Nova, para tomar licença e prosseguir viagem nas linhas da Leste até a estação Triângulo, onde entrava no Ramal de Paranaguá. À noite a criançada fazia fogueira com a casca e o bagaço da cana chupada durante o dia, juntados na varrição do terreiro.
Em quase todos os lugares comerciais, principalmente nos balcões das vendas e nos bancos das barbearias, a conversa rodava sobre a indústria de cana de açúcar.

As usinas bem como os assuntos se foram, restam duas usinas, Paranaguá II e Aliança, mas os tempos são outros, não sendo nada mais igual.

Setembro está para chegar, a botada de Aliança está marcada, a festa se foi, mas ainda se reza missa e se benzem os equipamentos. Bangüê estará presente para conhecer o que resta da botada.


OS CATINGUEIROS

canavialDenominação dada, pelo menos em Terra Nova, àquelas pessoas que em grupos se deslocavam do Sertão para trabalharem nos canaviais das usinas.

O mês de agosto se preparava para entregar os dias a setembro. A fumaça do “esquente” ia longe, bem longe. O grito se repetindo de pessoa a pessoa, de um lugar pro outro chegava no sertão, chegava na caatinga.

E lá vinham os Catingueiros, homens mulheres e filhos, do Sertão para o Recôncavo no rastro do trabalho no canavial. Começava a moagem.

Logo que chegavam se arranchavam no galpão, instalado no campo, espécie de senzala, propriedade dos lavradores de cana ou da própria Usina. Assim era em São Caetano, Felipe, Boa Sorte, Canabrava. Todos esses locais tinham, além do galpão, um Armazém onde o vale era moeda pro café, açúcar, farinha, carne seca e cachaça.

Bem cedinho, madrugada, antes de três vezes o galo cantar, sombras na neblina, passavam a conversar; só se ouvia o zum zum zun. Não era fila, iam um atrás do outro, passadas no ritmo do murmúrio.

Sandália de três tiras. Camisa grossa de mangas compridas, chapéu de palha abas bem grandes, anteviam dia ensolarado. As mulheres, além do chapéu, um lenço na cabeça amarrado em baixo do queixo escondia o cabelo.

Enxada transportada no ombro onde prendiam um facão, uma mochila com farinha seca e carne de sertão, uma cabaça, ou moringa com água de beber. Passavam para trabalhar nos canaviais, na limpa e no corte da cana, recebendo na quinzena por rego de cana.

Na noite, entre baforadas do cachimbo ou cigarro de palha, produzido de fumo de corda com a ajuda da faca de sete tostões, cismavam a terra que lá ficou

Cessou a participação dos catingueiros com prática de queimar a palha da cana,

ao invés de limpar, com uso de maquinário no canavial e com a implantação das leis trabalhistas.

Na migração, vinham profissionais: ferreiros, carpinteiros, seleiro, alfaiates, mulheres da vida, que, depois da moagem, ficavam nos campos da Usina no comércio da localidade, ou no morro.

Famílias formadas de casais desse povo, ou mesmo de migrantes com filhos da terra existem em Terra Nova.

 

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