DE VIRGULINO LAMPIÃO A LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Escrito por Viraldo B. Ribeiro Sáb, 16 de Maio de 2009 09:33
Número 20 Edição 01 – Sítio Inhatá, janeiro 2003
Não cabe mais percorrer uma região sem percebê-la nos seus aspectos sociais, econômicos e políticos. O Nordeste é uma dessas regiões bastante ricas nesse aspecto. É escolher o trecho, verificar no mapa e estudar. Pode-se iniciar a viagem a partir da Bahia, nas margens do rio São Francisco em Paulo Afonso, percorrendo-o até a sua foz. Margeando-se o rio, ora se está na sua beirada direita pisa-se em sertão baiano ou sergipano. Se a caminhada for do lado esquerdo, o mesmo sertão vira pernambucano ou alagoano. Penetrando-se mais para o centro, de um ou de outro lado, tem-se uma miniatura dos vários sertões do Brasil, que tem também seu pedaço no norte de Minas Gerais. A amostra escolhida tem como pilares, Paulo Afonso, Garanhuns e Caruaru. Esta é uma linha de ida que vai trançando também, nos lugares de Alagoas e Sergipe buscando aqui e acolá as pegadas dos predecessores, na mesma luta pelo essencial, destes dois destacados nordestinos – Lampião e Lula da Silva.
Chesf
Em Paulo Afonso, é fundamental visitar a barragem (só permitida com um guia) para conhecer a grande obra da CHESF, que tornou a cidade uma ilha. O monumento Luta da Sucuri com o Boi) próximo á entrada da usina, num dos lagos artificiais, sintetiza a luta do homem dominando a força bruta da natureza, transformando as quedas d’água em energia e caminhos navegáveis. É interessante um passeio a Prainha, formada por um dos lagos da barragem. Aí pode-se tomar banho, tomar uma cerveja e comer tira-gosto de pitu. Prosseguindo para Garanhuns, já tendo decidido o passeio de barco no Canyon do São Francisco, apesar do passeio ter origem em Canindé de São Francisco – Se, a estada em Piranhas- Al é mais recomenda, dê preferência ao Hotel Maria Bonita. Mas, muito cuidado, pois no caminho de Paulo Afonso para Piranhas tem uma Pedra. Se não encontrá-la, não tem importância é por que mudou de nome, agora é Delmiro Gouveia, que é a mesma coisa, e tem importância.
Hidroelétrica Delmiro Gouveia
Delmiro Gouveia é uma homenagem a um grande empreendedor cearense que saiu fugido de Pernambuco para Alagoas em 1903 com 40 anos de idade. Entre os mais diversos pioneirismos no sertão, como fábrica de linha de coser, que atendia o mercado do Rio, Recife e Fortaleza e Salvador, instalou em 1914, uma usina hidrelétrica (cujas instalações, no lado de Alagoas, se avistam da CHESF) que atendia a fábrica de linha de coser. Sua indústria passou a concorrer com as Linhas Corrente. O grupo inglês lhe fez as mais tentadoras ofertas para compra, sendo todas recusadas. Foi assassinado em 1917, não levando adiante outros projetos ambiciosos. Em 1930, depois de ser vendida para os gringos, a fábrica de linha foi completamente destruída, e seus maquinários jogados no rio. Como Lampião, que veio depois dele, Delmiro tinha suas leis próprias ou apropriadas para Pedra, concebida , edificada e confinada por uma cerca, lugarejo onde instalou sua fábrica de linhas. As saídas eram controladas.Não tinha igreja, nem padre ( para não dividir a liderança), porém tinha cinema, futebol, bailes. Tudo era controlado pela fábrica.Os solteiros que trabalhavam na indústria moravam fora e até o namoro era controlado. No cinema, mesmo os casados sentavam separados. Até o imposto do comércio que deveria ser recolhido para prefeitura de Água Branca foi arrematado por Delmiro, para evitar os intrusos.
Estação Piranhas
Piranhas é uma agradável surpresa, se fez encostada, como se diz, no pé da serra, apreciando o zig zag dos barcos entre as correntes pedras e redemoinhos. Sua importância não se prende somente à simpatia geográfica, sua limpeza, a empatia de sua gente. Alie-se também a sabedoria dos seus agentes de cultura sobre a vida dos cangaceiros, particularmente Lampião, e dos seus adversários. Acrescente-se que nesta cidade começava a Estrada de Ferro Paulo Afonso cujos trilhos estendiam-se por 116 Km até a cidade de Petrolândia, por onde circularam suas Marias Fumaças de1822 a 1964, ligando o baixo ao médio S.Francisco. Esta estrada de Ferro foi uma autorização de Dom Pedro II “Decreto 6918 01 de janeiro de 1878”. Do Livro Estrada de Ferro Paulo Afonso de Luiz Ruben . A estação de Piranhas é hoje um espaço cultural, mas quase a totalidade do que se tem sobre a ferrovia se encontra na estação Delmiro Gouveia Museu Delmiro Gouveia onde estão também documentos da história da Fábrica têxtil, e de Delmiro. Tem mais sobre Piranhas “Tem boi no pasto! Esta frase foi usada pelo telegrafista de Piranhas como código para informar a localização de Lampião na Fazenda Angico no Estado de Sergipe. Em 1938 as cabeças de Lampião e Maria Bonita foram expostas em Piranhas, próximo a Estação.”-Estrada de Ferro Paulo Afonso, pág. 107
Piranhas fica eqüidistante de duas cidades de Sergipe. Uma é Canindé de São Francisco, município onde está situado o Lago do Xingó donde sai para um passeio de Catamarã no Canyon do São Francisco. A outra é Poço Redondo, onde fica situada a fazenda Angico onde morreu Lampião, em 1938. Para se chegar a gruta, desce o rio a partir de Piranhas e, com um guia, mete-se numa trilha entre quixabas e mandacarus, sobre pedras, exposto ao sol escaldante, subindo e descendo. Lá no entalhe da pedra, está o lugar em que Virgulino foi surpreendido dormindo pela volante do Tenente Bezerra.
DE LAMPIÃO A LULA DA SILVA
A Fazenda Angico não tem nenhuma beleza, o que tem para se admirar, durante a ‘trilha’ são as asperezas da caatinga, da quixaba, das pedras, dos córregos que estão escondidos esperando a trovoada. Entre uma subida e outra, até chegar no lugar do cerco, um guia bem informado vai dizer porque o Capitão não era perseguido em Sergipe e na Bahia, por isso baixou a guarda, bebeu cachaça e foi pego de surpresa; porque o contrário, em Alagoas e Pernambuco; porque o chefe de policia desconfiou do volume de compras que um coiteiro fazia na feira de Piranhas; porque ele disse que a volante ia pro lado contrário; porque Getúlio deu ultimato aos quatro governadores dos estados. Isso tudo fica-se sabendo enquanto se descansa do escaldante Sol numa árvore de pouca sombra, tomando mais um gole de água da garrafinha, mais para hidratar do que matar a sede. No retorno, um restaurante doméstico aguarda para o restabelecimento das forças. Antes do surubim, pitu(que já não são tantos), uma cerveja ou refrigerante, um banho no rio, depois sombra de mangueira e jogar conversa fora para relaxar.
Estaria, se quisesse, terminado a primeira etapa do circuito De Lampião a Lula da Silva na trilha de Angico. Mas é louvável incluir no roteiro, que surge na conversa com os nativos, as rendeiras. De barco chega-se até elas na cidade de Entremontes, que fica no lado de Alagoas, na beira do rio, antes do ponto fluvial para Angico. Ou então pela estrada a uns quarenta e cinco quilômetros de Piranhas.
Entremontes fica no estado de Alagoas. Com certeza, quem dispensar um tempo maior, vai encontrar coisas singulares que farão a estada agradável. Pelo menos de passagem percebem-se duas Associações de Rendeiras: uma na margem do rio e a outra na praça, próximo à igreja. É bem menor do que Piranhas, porém tem seu pequeno cais e uma praça. A existência de associações para congregar as rendeiras, ação oriunda delas, é um bom sinal, pois indica a visão coletiva da comunidade, e auto-conhecimento de cidadania. Mesmo assim, os meninos, por necessidade ou vício, já estiram a mão.
Nesse pedaço de viagem, nessa parte primeira da amostra do Sertão, que não deve divergir dos muitos outros, pois cenário, trama, enredo, personagens são iguais, encenando o ter e o não ter. Por isso há ainda muitos produtores de Coriscos (mais sofisticados), não leram a lição; muitos viciam mão estendida, como dizia Luiz Gonzaga. Mas a Esperança também está presente produzindo Delmiros e Coriscos com outras armas, mais próprias, para qualquer ocasião.Trocando da mão cuia ou faca por suor.