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DESCOBRIDORES

Número 35 – Edição 01 – Terra Nova, março 2004
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DESCOBRIDORES

mapaDepois de Pedro Álvares Cabral (1500) e antes do início da Colonização (1531) diversos indivíduos atravessaram o Atlântico, seja como comandantes ou tripulantes de navio, seja como degredados ou até mesmo náufragos, e pisaram em terras brasileiras, devendo também ser considerados descobridores do Brasil.

Nessa pluralidade, destacam-se três portugueses: Martim Afonso de Souza, Caramuru – Diogo Álvares Correia – e João Ramalho.

“No dia 20 de novembro de 1530, o fidalgo Martim Afonso de Souza foi chamado de Paço de Évora para uma reunião com o rei João III. Aos 30 anos de idade, Martim Afonso era amigo pessoal e convivia com o monarca desde a infância. Mas, até então, nunca tinha sido incumbido de missão tão importante quanto aquela para a qual seria designado – a maior desde a descoberta em 1500 e a primeira comandada por um fidalgo.” Capitães do Brasil, Eduardo Bueno, pág.19

A missão do comandante não era apenas expulsar os franceses traficantes de pau-brasil, dar força às feitorias, e depois, numa tentativa de ocupar as terras, doá-las num regime de sesmarias. Afirmam alguns estudiosos que o principal objetivo da esquadra era descobrir “uma misteriosa Serra da Prata”, minas de ouro.

A chegada de Martim Afonso ao Brasil (Pernambuco) foi em 31 de janeiro de 1531, depois de quase sessenta dias de viagem, a contar da partida em 3 de dezembro do ano anterior. Tratou logo de expulsar os franceses, recuperou a feitoria de Igaraçu (ilha de Itamaracá) saqueada pelos franceses.

A etapa seguinte foi na Bahia, tendo a esquadra entrado na Baía de Todos os Santos em 13 de março de 1531. Aí se encontrou com Caramuru, um náufrago que vivia com a tribo dos Tupinambá. “Por quase um mês, Martim Afonso permaneceu na Bahia, onde os indígenas o receberam ‘com grandes festas e bailes’. Se seu objetivo fosse dar início à colonização do Brasil, o comandante não deixaria de perceber que tinha acabado de desembarcar no local ideal. Afinal, além da localização estratégica e dos ‘bons ares’ da Bahia, as circunstâncias favoráveis ditadas pela sólida aliança entre Caramuru e os Tupinambá devem ter ficado evidentes para Martim Afonso”.(Obra citada, pág. 46).

O terceiro porto do navegador português foi na baía de Guanabara, aonde chegou no dia 30 de abril. Foi no Rio de Janeiro que Martim Afonso estabeleceu

sua primeira base. “Embora soubesse que o Rio de Janeiro se localizava ao norte da região que deveria explorar, Martim Afonso decidiu estabelecer ali sua primeira base no Brasil. Já no dia seguinte ao desembarque, seus homens deram início à construção de uma sólida paliçada de toras pontiagudas. Dentro dela, ao longo das semanas seguintes, ergueram uma casa-forte, um estaleiro rudimentar e uma ferraria. (Obra citada, pág. 47).

Depois de três meses de permanência no Rio de Janeiro, o comandante seguiu para S. Paulo, chegando próximo à fronteira do Paraná em primeiro de agosto de 1531. Após diversas excursões no estuário do Prata, á procura do “ouro branco”, desembarcou numa baía do litoral de S. Paulo, num ponto já habitado e visitado por vários navegadores. “Por coincidência, Martim Afonso desembarcou naquela baia do litoral de São Paulo em 22 de Janeiro de 1532 – o mesmo dia no qual, exatos 30 anos antes, ali haviam chegado Américo Vespúcio e Gonçalo Coelho. Como 22 de janeiro é dia de São Vicente – padroeiro de Portugal -, fora com o nome desse santo que Coelho e Vespúcio tinham batizado o local. Martim Afonso manteve a denominação, mas durante vários anos os portugueses continuaram se referindo ao vilarejo como Porto dos Escravos. (Obra citada, pág. 57 e 58). Além de manter o nome, Martim Afonso tornou o lugar uma vila. Vila de São Vicente, a primeira do Brasil, situada na parte baixa da planície. Na parte alta, no topo, a vila de Piratininga.

Essas duas vilas foram fundadas quase simultaneamente. “E fez uma vila na ilha de São Vicente e outra nove léguas dentro pelo sertão, a bordo de um rio que se chama Piratininga, e repartiu a gente nestas duas vilas e fez nelas oficiais e pôs tudo em boa obra de justiça de que a gente toda tomou muita consolação com ver povoar vilas e ter leis e sacrifícios e celebrar matrimônios e viverem em comunicação das artes e ser cada senhor de si e suplantar as injúrias particulares e terem todos os outros bens de vida segura e conversível.

Era a primeira tentativa de implantar a lei e a ordem lusitana no território até então entregue em mãos dos náufragos e degredados.(Obra citada, pág. 65 e 66). págs. 65 e 66*.

Em São Paulo, Martim Afonso encontrou João Ramalho, um náufrago que, como acontecia com Caramuru na Bahia,era casado com a filha do chefe da tribo com a qual convivia.

Depois que partiu do Brasil para Portugal, em maio de 1533, Martim Afonso não mais visitou os lotes que lhe coube na partilha do Brasil em capitanias. Esses lotes ficavam em São Vicente e no Rio de Janeiro. “O próprio donatário se desinteressou de tal modo por suas possessões coloniais que nem sequer as visitou durante a jornada para a Índia, embora tenha feito escala na Bahia – onde chegou em junho de 1534, lá deixando sete frades franciscanos, encarregados de evangelizar os Tupinambá que viviam junto a Caramuru.”(Obra citada, pág. 65 e 66).

Caramuru, Diogo Álvares Correia, conviveu (desde 1509) com os nativos na Bahia desde os 17 anos,morreu em 1757.

“Caramuru era Diogo Álvares. Natural de Viana, no norte de Portugal, ele fora o único sobrevivente do naufrágio que, por volta de 1509, engolira seu navio nos traiçoeiros baixios do rio Vermelho, que fica a poucos quilômetros ao norte da ponta do Padrão (atual Farol da Barra). Os Tupinambá o encontraram entre as rochas costeiras – circunstancia que acabou lhe dando o apelido indígena: em tupi, ‘caramuru’ designa uma espécie de moréia, ou enguia, que vive entre as pedras.

Acolhido pela tribo, Álvares, então com 17 anos, se uniu com Paraguaçu, filha de Itaparica, o líder dos Tupinambá e senhor da ilha que mantém o seu nome.”(Obra citada, pág. 65 e 66.)

Como líder de parte da tribo dos Tupinambá, Caramuru foi muito importante para implantação das Capitanias Hereditárias na Bahia e para o Governo-Geral. Esteve na França com sua mulher, a índia Paraguaçu. Lá se casaram, após ela ter sido batizada, passando a chamar-se Catarina Paraguaçu. Esse fato constata a estreita ligação dele com os franceses, no comércio ilegal de pau-brasil.

João Ramalho é outro português que vivia no Brasil quando aqui chegou a expedição de Martim Afonso. Vivia em Piratininga (S. Paulo) completamente adaptado aos costumes indígenas, diferente de Caramuru, que preservou alguns costumes europeus. Dizia-se que Ramalho praticava até a antropofagia.

Em São Paulo, Martim Afonso encontrou João Ramalho convivendo com os índios tupiniquim e casado com a filha do chefe (Bartira), tal como vivia o náufrago Caramuru.

Como Caramuru, vivia com muitas mulheres, hábito natural dos índios para com os estranhos. Este costume era chamado de Cunhadismo – “consistia em lhes dar uma moça índia como esposa. Assim que ele a assumisse, estabelecia, automaticamente, mil laços que aparentavam com todos os membros do grupo. […] Assim é que aceitando a moça, o estranho passava a ter nela sua temericó e, em todos os seus parentes da geração dos pais, outros tantos pais ou sogros. O mesmo ocorria com a geração, em que todos passavam a ser seus irmãos ou cunhados. Na geração inferior eram todos seus filhos ou genros. Nesse caso, esses termos consangüíneos ou de afinidade passavam a classificar o grupo como pessoas transáveis e incestuosas” (O Povo Brasileiro, de Darcy Ribeiro, pág. 81)

Sobre João Ramalho, na pagina 62 do livro Capitães do Brasil, Eduardo Bueno informa: Líder de um vasto exército particular, destemido e desafiador, João Ramalho seria, por vários anos, o verdadeiro senhor da região de São Vicente e Piratininga. Não apenas Martim Afonso, como também seus sucessores não tomavam uma só decisão relativa àquele território sem antes consultá-lo. Nem mesmo os muitos conflitos com os jesuítas – por causa de sua escandalosa poligamia e em função do lucrativo tráfico de escravos que ele dirigia – seriam capazes de arrefecer o seu poder […] Além do depoimento do padre Nóbrega, o primeiro governador-geral do Brasil, Tomé de Sousa, também escreveria ao rei D. João referindo-se a João Ramalho. “Ele tem tantos filhos, netos e bisnetos que não ouso dizer a Vossa Alteza’’.

“João Ramalho morreu em 1580, com quase 100 anos”.

Esses homens que chegaram depois às terras descobertas por Cabral, viabilizaram o comércio com os europeus, geraram famílias com os nativos, e dessa geração de mamelucos outras famílias com brancos europeus. Pode, portanto, considerá-los também descobridores do Brasil.

Escrito por Viraldo B. Ribeiro
Sáb, 16 de Maio de 2009 12:03
abril 2004

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