• Sem categoria

HISTÓRIAS DO MASSAPÊ; A FEIRA E SEUS PERSONAGENS

Escrito por Viraldo B. Ribeiro
Sáb, 16 de Maio de 2009 11:22
________________________________________
Número 28 – Edição 01 – Terra Nova, setembro 2003
________________________________________

HISTÓRIAS DO MASSAPÊ

fuqueiraTenho oitenta e oito anos.
-Oitenta e oito!
Sim, oitenta e oito. Quem nasce em quinze quantos anos tem?!
Fui a caçula de quatro irmãos, dois homens e duas mulheres.
Menininha era antes de mim, morreu de parto.
Firmino era o mais velho o outro era Neco.
Todos já morreram.
– Fale da morte, de parto de Menininha
Ficou com dores por três dias. Por causa da ignorância do tempo morreu.
Ela casou com Manoel Vicente.
Era o primeiro filho dela.
Quando eu tinha três anos Pepê deixou Fulô.

– Foi por causa da história da mulher de Alagoinhas?
Florentino Ribeiro da Conceição era o nome de Fulô.
Maria de São Pedro Lourenço era o nome de Pepe.
Ela era aloirada de olhos azuis e ele era preto.
Firmino foi criado pelo meu avô Romão

– Deve ter sido quando Pepê ficou sem marido
Não sei se antes ou depois
Fulô tinha outra filha de nome Engraça, a mãe também era aloirada.
O cabelo de Pepê vinha aqui na cintura.
Pepê e Fulô eram de Santo Amaro lá dos lados de Acupe
Fulô roubou Pepê de seu irmão e veio para Terra Nova

– Como era o nome do irmão de Fulô?
Não me lembro.
Quando Pepê veio para Terra Nova já tinha morrido todo mundo, pai e mãe.
Seu pai ou seu irmão chamava Inácio e a irmã chamava Júlia.
Quem sabia dessas coisas era Neco.

Deixou em Acupe os filhos Rozendo, João e Mocinha.
Ela falava muito de Mocinha com a gente.

Acho que Rozendo já morou em Terra Nova.
A mulher dele chamava Preta
Preta era uma morena muito bonita.

Pepê tinha um irmão (ou primo?) que vinha de Acupe para vender aqui na feira (Terra Nova).
Vendia azeite de dendê, licurí (na casca).
Ele vinha montado num boi, todo mundo ficava espiando.
Aqui não fazia boi de montada.
A gente gostava quando ele vinha, pois a gente quebrava coquinho.

Pepê voltava sempre a Acupe, era sempre na quaresma.
Ela trazia azeite, peixe (xangó).
Gostava de pescar de noite.
– Talvez um hábito do mar?
Talvez
Vivia de roça , carregar água do Caipe , lavar roupa e vender fato.

HISTÓRIAS DO MASSAPÊ

Santo Amaro, 7 de setembro de 1881
Jornal Echo
“Compra-se escravos.
Nesta tipografia se dirá quem compra de oito a dez escravos, para serem libertos depois de prestarem cinco ou seis anos de serviços.
O comprador garante as vantagens por uma escritura pública, assim como declara que não convém escravos maiores de 40 anos, ou que não sejam válidos.
Quem pretender deixar carta n’esta tipografia para contratar-se”

Eco numero 47 de 7 de agosto de 1881
“Tendo desaparecido do abaixo assinado sua escrava de nome Mariana, cabra de 25 anos de idade, gratifica com 20$500 quem a apreender nesta cidade e com 50$000, fora daqui, entregando-a ao anunciante.
Esta escrava é aqui muito conhecida, e por ter pertencido ao finado Francisco Mendes Fonseca, e consta achar-se acoitada n’esta cidade, pelo que protesta o comerciante pelos dias de serviço e procede criminalmente contra quem a tiver acoitado.
Santo Amaro, 08 de agosto de 1881.
Manoel Zacarias dos Santos”

Os dois textos foram transcritos diretamente do jornal Santamarense O Echo 1881/1884, arquivado na Biblioteca Publica, Sala de Jornais e Revistas Raras.

A FEIRA E SEUS PERSONAGENS

feiraImagem de um dia de domingo no fundo do Mercado de Terra Nova.
A feira da semana cai numa segunda-feira. As mercadorias começam a chegar já no domingo, principalmente os gêneros gerados nas proximidades.

Na foto, tirada pelo Bangüê em setembro de 2002, os animais, alguns com as “malas de farinha” vazias no lombo, e os outros só com as cangalhas, descansam na sombra da árvore.

O grosso das mercadorias começa a chegar na madrugada de domingo para segunda.

Antigamente, diz-se assim quando se tem intimidade com o tempo, antigamente, quando o principal transporte era o Trem de Santo Amaro/Catuiçara, os dias de feira eram programados, nos lugarejos próximos (distritos de Santo Amaro) de forma que os feirantes pudessem participar das feiras, pois parte deles circulavam de uma para outra.

Assim a feira de Jacuipe era domingo, a de Terra Nova era segunda, a de Catuiçara era sábado, como também a do Jacu. Todos esses locais faziam parte do trecho ferroviário facilitando o deslocamento dos feirantes de uma para a outra feira.

Nessa época a praça do mercado era uma área grande, sem calçamento (tempo de chuva era uma lama danada) onde se arrumavam as barracas de verduras, frutas, peixe seco, hortaliças, se vendia passarinho, galinha, porco, peru e periquitos, se armavam bancas de jogos de azar.

Esse espaço era limitado pelo Armazém da Usina que se confrontava com o Mercado e pela Igreja e o Ponto Ceem (ponto ferroviário), que também se confrontavam (se assim se pode dizer pois o Ponto Ceem ficava de fundo para a igreja). Assim era formado esse quadrado.
O fundo do Mercado, mostrado na foto, está exatamente no centro do “Y” que o ramal da Leste (linha férrea) fazia com o ramal da Usina, o primeiro indo para Catuiçara (Teodoro Sampaio) e o segundo para os Pontos de Cana.
Dentro, cada coisa no seu lugar, ficava: a parte da farinha, dos açougues de carnes, dos ourives e armarinhos, e das barracas de café , mingau e bolos. Criaram os seus e ficaram bem conhecidos “os de dentro do mercado”: Seu Antonio Salim e Seu Braga, vendendo carne de boi; Mundinho do Porco; Dona Almerinda, com seu armarinho; Dona Elisa do Mingau; Ulisses e sua farinha do Quicé.
Ainda hoje, não sei se para voltar no tempo (para o Bangüê, tudo bem!), mesmo com todo o calçamento do distrito emancipado de S.Amaro, sem mais com aquele ”Y “ da linha ferroviária, sem mais a lama nos tempos de chuva, nem o Ponto Ceem, mas ainda mesmo assim, repetindo, os animais estão lá amarrados nas árvores obrando e urinando protegidos do sol.

Fosse no tempo de Seu Antonio Pequeno, fiscal de tributos do município, que circulava entre um vendedor e outro, com um talão e uma caneta na mão, recolhendo o imposto, aqueles burros não estariam mais ali, seguiriam em fila , amarrados um na cangalha do outro, puxados por um menino a pé ou montado, para pastarem, sob a guarda do município, lá pelos lados da Salgadeira, lá dos lados da Ponte dos Carros, perto do campo de bola.

Nesse cenário, viveu com certeza Cardoso. Cardoso era o nome que ganhou o urubu de asa quebrado, que voava com dificuldades, (na verdade pulando em grandes saltos), que conviveu entre gente, cachorro, porco e galinha alimentando-se das sobras da feira.

Estes, para quem não conheceu, foram personagens da feira de segunda feira de Terra Nova.

Viraldo Ribeiro

Viraldo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *